Quando eu era uma criança – tinha apenas 11 anos –
presenciei algumas cenas muito chocantes e traumáticas para um garoto da
minha idade. Na noite do dia
31 de março de 1964, quando os militares assumiram o Poder num golpe de
Estado que depôs o presidente João Goulart, assisti militares, fardados
e armados, entrarem em minha casa da rua Cesário Alvim, caçando o então
Ministro da Justiça, Abelardo Jurema, considerado
foragido e sem culpa formada.
No dia seguinte, outra cena dantesca: os muros de nossa
residência, localizada em Botafogo, no Rio de Janeiro, amanheceram
pichados grosseiramente, com ofensas
ao meu saudoso pai, tachando-o de “comunista” , “ladrão”,
“corrupto” e outros adjetivos que jamais se enquadrariam ao
perfil do político íntegro, justo e comprometido com o bem comum que ele
sempre foi.
Naquela mesma data, minha mãe, dona Vaninha , era
retirada de sua casa e levada por amigos, com os seus filhos menores,
para um outro endereço – o apartamento
do engenheiro paraibano Roberval Guimarães, em Copacabana - por
questões de segurança. A família do ministro Abelardo também estava
ameaçada pela sanha dos “revolucionários”.
Enquanto isso, no quartel general da Urca, preso numa
sala do alto comando do Exército, um ministro e deputado federal pela
Paraíba era ofendido e desacatado
por oficiais das forças armadas, jovens e exaltados. Até cusparadas no
rosto recebeu, como relata no livro Sexta-feira 13 - Os últimos dias do
Governo Goulart, em que narra os episódios da época.
São essas atitudes de radicalismo político e ideológico, que se observam agora, que ameaçam a paz da sociedade brasileira, onde
o ódio e revanchismo se sobrepõem ao equilíbrio e a razão.
Neste final de semana, grupos de manifestantes, em várias cidades brasileiras, promoveram carreatas e atos públicos
de apoio ao presidente Jair Bolsonaro, numa atitude legítima,
prevista na Constituição, que assegura esse direito como forma democrática para garantir a livre expressão. Mas o
que soou estranho foi a real motivação que a determinou, com grupos fanáticos pedindo
a reedição do Ato Institucional número 5, a
destituição do Congresso Nacional , do Supremo Tribunal Federal e o fechamento dos meios de comunicação
o que, na prática, significaria o retorno da Ditadura Militar
que prevaleceu no Brasil por 21 anos.
Nada contra os militares, indispensáveis à soberania e à segurança da
Nação, que prestam inestimáveis serviços ao País. Mas, como disse o
ministro Luiz Roberto Barroso, uma das vozes mais abalizadas e serenas
do STF, “é assustador ver manifestações dessa natureza
após 30 anos de democracia”.
- Só é a favor desse retrocesso extremo quem perdeu a fé no futuro.
Ditaduras vêm com violência contra adversários, e muitas vezes contra
os próprios aliados, com censura, imposição e intolerância. Pessoas de
bem e que amam o Brasil não podem entrar nessa
cilada”.
O momento é grave. Que Deus nos proteja a todos contra a insensatez e a insanidade.
A ameaça radical
13 Jun 2020- 175