Abelardo Jurema Filho
Quando eu tinha 18 anos, desfilando com meus cabelos longos e jeito rebelde pela praia de Copacabana, imaginava que era imortal e que o tempo não passaria para mim. Estávamos em 1970, o Brasil Campeão do Mundo no México e eu jogando futebol de areia, paquerando as meninas e tocando rock and roll, imaginando que nada seria capaz de me deter e que a vida era apenas isso: diversão e alegria.
Para mim, no vigor da minha juventude, um homem de 50 anos era “um velho” e o ano 2.000 representava um futuro muito distante, quase inatingível. A virada do século era tida como uma data simbólica e muitos acreditavam que poderia significar o fim do mundo, de acordo com as previsões de astrólogos e videntes.
O tempo seguiu o seu curso e muita água passou por baixo – e por cima – da ponte. Vim para João Pessoa, casei, tive filhos; obtive vitórias, enfrentei adversidades e acumulei duras perdas entre amigos e familiares que se foram antes do tempo; percorri uma longa trajetória que me transformou em avô de quatro netos e patriarca de uma grande família que sempre está a exigir atenção e cuidados, mas que, por outro lado, me enche de prazer e orgulho.
Hoje, aos 69 anos, reitero meu entusiasmo pela vida e disposição para encarar novos projetos. Mas revelo as minhas preocupações em relação ao futuro da humanidade, a evolução desmedida da automação, da engenharia genética, com o receio de que o ilimitado desenvolvimento tecnológico venha a produzir gerações de verdadeiros cyborgs, transformando homens e mulheres em seres sem sentimentos nem valores referenciais de família que, embora duramente atingida, continua a ser o principal alicerce da sociedade.
Foi pensando nisso que, nesse réveillon, decidi recusar convites para festas e grandes eventos. Resolvi que o melhor ambiente para aguardar a chegada do ano novo seria ao lado dos meus familiares, usufruindo o calor de suas presenças, o abraço afetivo, sincero e leal daqueles que estão mais próximos, que acompanham as nossas agruras, que compartilham as nossas conquistas e dividem as nossas emoções, nos bons e maus momentos.
Chegamos a 2022. É de se esperar que traga bom senso, equilíbrio, tolerância, solidariedade, caridade e fraternidade nas relações humanas. Que marque a vitória da ciência contra o negacionismo. Da cultura sobre a ignorância. Da exaltação do amor sobre o estímulo ao ódio e à violência. Da prevalência da natureza e preservação do meio ambiente sobre a devastação de nossas florestas, mares e rios. E do combate permanente à fome e à miséria, dando comida a quem tem fome e água a quem tem sede.
Que as palavras do filho do Homem soem mais fortes em nossos ouvidos. Que os seus exemplos norteiem as nossas atitudes e que venhamos a praticar, com fé e convicção, o maior dos ensinamentos cristãos: “amai o próximo como a ti mesmo”.
Roubo os versos de Ivan Lins para definir o sentimento que nos alimenta nesse momento de mudança: “um novo tempo, apesar dos perigos, da força mais bruta, da noite que assusta, estamos na luta, para que nossa esperança, seja sempre um caminho que se deixa de herança”.
Que Deus nos abençoe a todos.
Apesar dos perigos
20 Dez 2021- 213

