Abelardo Jurema Filho
Eu conheci Marcos Pires tão logo cheguei a João Pessoa, em meados de 1975. Naquele tempo, difícil seria desconhecer a sua presença na cidade: era filho de Adrião e Dona Creusa Pires, o “playboy” cujo passa tempo predileto era gastar dinheiro e fazer amigos. Era um jovem irrequieto, desafiador e inspirador, que exercia natural liderança junto aos companheiros de sua geração, que acompanhavam a suas aventuras, divertiam-se com elas e admiravam a forma generosa como dividia suas emoções.
Se havia um carro novo, esportivo, de último tipo, circulando na cidade, ninguém tinha dúvida a quem pertencia: se uma novidade aparecesse no mercado automotivo, um triciclo que só conhecíamos do cinema – no filme Sem Destino (Easy Rider) - só podia ser mais uma peripécia do herdeiro dos Pires. Cheguei a encontrá-lo no Rio de Janeiro onde era hóspede permanente do Hotel Sheraton, ainda hoje um dos mais elegantes e sofisticados da hotelaria carioca.
Carismático, envolvente, imperativo, Marcos Pires também conquistava pela solidariedade com os amigos que não selecionava pela posição social. O bêbado da esquina, o lavador de carros, o desvalido que circula pelas madrugadas e os garçons com quem divide alegrias e tristezas também fazem parte do seu círculo de amizades, a quem trata com a mesma distinção. Pelo seu poder de sedução reinava absoluto numa geração de ouro que fez história na cidade.
Num dos seus sonhos, inspirado pelo poeta Manoel Bandeira, imaginou a Passárgada: uma boate onde todos fossem amigos do Rei e pudessem usufruir a plenitude da juventude num ambiente mágico, onde era possível ver as estrelas e dançar cercado por uma cortina d’água como uma fonte luminosa. Vivíamos os tempos das Discotecas e dos Embalos de Sábado à Noite.
Certo dia, Marcos Pires reúne os amigos para fazer um comunicado solene:
- Estou de partida para uma viagem de Lua de Mel na Europa (havia casado com a jornalista Nereida Barreto) e decidi escolher o meu amigo Abelardo Jurema para dirigir a boate durante a minha ausência.
Fiquei orgulhoso e feliz. Imaginava que seria o Rei da Noite na Paraíba. Recebi as chaves e comecei a trabalhar.
Logo na primeira semana percebi a diferença entre ser frequentador e administrador do negócio, que exigia uma série de providências que desconhecia inteiramente. Reservas de mesa, abastecimento, suprimentos, fiscalização nas contas, comandas e tantas outras medidas pertinentes à nova função. E o pior vinha quando do fechamento do faturamento, de onde retiraria a minha “participação nos lucros”, e percebia que metade da casa era de amigos de Marcos Pires, com direito a assinar vales, que jamais seriam quitados...
Como se vê, a experiência foi válida, mas demorou muito pouco. Duas semanas depois fui à mansão dos Pires, na avenida Epitácio Pessoa, e devolvi as chaves a dona Creusa Pires explicando os motivos de minha “demissão”.
Mas posso dizer que conheci o lugar sonhado por Manoel Bandeira, onde nada me faltava e eu era – e continuo sendo - amigo do Rei.
Depoimento para o livro de Marcos Pires, que será lançado em breve.
O amigo do Rei
25 Out 2021- 201

