Eu o estimava muito. Era um sentimento sólido desde que percebi que estava diante de um homem criterioso, de caráter, consciente do seu papel e de suas responsabilidades, pessoais e profissionais. Era ele o médico Ivanildo Tomé de Arruda com quem formei, por alguns anos, na Escola de Samba Society , na realidade uma grande batucada que, nos carnavais de outrora, invadia as casas dos amigos levando musica , entusiasmo e alegria.
Era um homem de poucas palavras e muitas ações. Na condição de mastologista, especialidade médica que estuda, previne, diagnostica e trata todas as doenças da mama, convivia diariamente com casos de câncer que atingem, diariamente, mulheres que sofrem e, por vezes , morrem, por conta desse mal tão perverso com a alma feminina.
Certa vez enfrentei um caso na família. Minha irmã, Rosalinda, com apenas 40 anos, foi surpreendida com uma lesão no seio que precisava ser investigada. Recorri ao meu amigo em quem confiava cegamente, e levei-a em sua clinica. Numa época em que os exames por imagem se limitavam às radiografias e mamografias, e que a ultrassonografia ainda era uma grande novidade no País, o exame demorou poucos minutos. Fez-lhe algumas perguntas e, em seguida, apalpou a região afetada com o toque mágico de seus dedos. Mas evitou maiores comentários, afirmando que o diagnóstico necessitava de outros exames complementares.
Reservadamente me deixou a par do que do que encontrou: “sua irmã tem um nódulo na mama esquerda, com cerca de 5 cm de diâmetro e com toda a característica de ser um tumor maligno. Recomendo que você vá a Campinas, em São Paulo, onde está instalado o primeiro Tomógrafo Computadorizado do Brasil, capaz de tirar qualquer duvida à respeito”.
Levei-a lá e quando recebi o resultado, lá estava escrito mais ou menos assim:
- Imagens de um nódulo com 5 cm de diâmetro, com sinais positivos de malignidade. Necessário biópsia para identificar origem e característica do tumor.
Rosa se foi há quase 30 anos. Mas eu jamais esqueci aquele dia, tão dolorido para mim, mas que me deixou orgulhoso com a precisão do meu amigo paraibano, que conseguia ver tudo com os olhos da experiência.
O homem dos olhos de Raio X
03 Nov 2019- 116