Quando deputado federal, ou mesmo como ministro de Estado, o meu pai
mantinha uma vida simples de um servidor público. Gostava de ir ao
açougue comprar a sua própria carne. De ir ao mercado
escolher o peixe que iria servir no almoço para os amigos. E era freqüentador habitual da feira livre,
montada no Humaitá, em Botafogo, onde escolhia frutas , verduras e
conversava com os feirantes. Não fazia isso para fazer média com o
eleitorado, nem para ganhar popularidade artificial: era assim que agia
naturalmente, pelo prazer de conversar com as
pessoas e de não esquecer que, antes de ser uma autoridade pública,
era apenas um homem, um cidadão como todos os outros.
Morávamos numa casa alugada , no endereço da
Cesário Alvim 27, que, na realidade, pertencia ao empresário Thomas
Leonardo, um dos fundadores das Lojas Americanas,
que era proprietário de outros imóveis na rua. Politico
que vivia dos seus vencimentos como parlamentar federal, numa época em que ninguém ouvia falar em cotas
de gabinete, emendas parlamentares e verbas
indenizatórias, Jurema mantinha a família numerosa de forma modesta,
educando a todos sem luxo, sabendo dar valor ao dinheiro, sem se
preocupar em garantir o futuro,
mas viver o presente com dignidade e honradez.
Vez por outra minha mãe, dona Vaninha, estava
a reclamar do marido a escassez de dinheiro para suprir as necessidades domésticas, condenando os elevados gastos das campanhas
que levaram até mesmo a herança
que recebeu do seu pai, o coronel Oswaldo Pessoa, incluindo uma bela
casa em Jaguaribe, berço da aristocracia da cidade, vendida para arcar
com os compromissos eleitorais.
Hoje, tudo mudou. Ao invés de gastos e dívidas, candidatos falam em
“sobras de campanha”; em pouquíssimo tempo de mandato, constroem um
patrimônio bem maior do que o que possuíam antes da eleição; e ganham
rios de dinheiro com as facilidades e
benesses que os cargos lhes oferecem e com as propinas que obtém no favorecimento ilícito a grandes empresas e grandes negócios.
Infelizmente, o sistema político brasileiro está apodrecido. Somente uma
grande reforma, modificando toda essa estrutura de Poder e do
funcionamento da máquina pública, será capaz de produzir as mudanças
necessárias ao Pais para livra-lo, definitivamente, da
situação vexatória em que se encontra, quando os nossos homens públicos, seduzidos pelo ganho fácil, acostumaram-se com práticas incompatíveis com o exercício da
política.
O ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, um dos símbolos mais
eloqüentes da corrupção nacional, resumiu numa frase o que sentia com os
milhões de dólares que desviava para as suas contas bancárias: “era
tanto dinheiro que fiquei viciado”. Maldito vício
que destrói reputações e envergonha a população brasileira.
O vício maldito
13 Jun 2020- 183